Desigualdade de gênero no Judiciário: mulheres avançam, mas ainda são minoria nos cargos do topo
CNJ revela que, apesar de progressos na primeira instância, a representação feminina cai drasticamente nos tribunais superiores, com alguns estados sem mulheres no cargo de desembargadora
O Relatório Justiça em Números 2024, publicado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ofereceu uma visão atualizada sobre a participação feminina no Poder Judiciário. Com base nisso, é possível tecer alguns comentários sobre como anda a igualdade de gênero no Judiciário brasileiro.
Panorama atual da participação feminina
O Censo Demográfico de 2022, do IBGE, constatou que a população brasileira é composta por um maior número de mulheres em comparação aos homens, com 51,5% dos habitantes do sexo feminino e 48,5% do sexo masculino. Entretanto, tal paradigma não se traduz no cotidiano do judiciário brasileiro.
Ao analisar o primeiro grau da Justiça Estadual, alguns tribunais se destacam, seja pelo alto ou pelo baixo grau de representatividade feminina, conforme pode ser visualizado no Gráfico 01.
Ao analisar o primeiro grau de jurisdição, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ), se destacou com uma das maiores representações femininas, com 52,7% de mulheres na magistratura. Outros tribunais, como o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) (50,1%) e o Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) (45,7%) também apresentam números razoáveis. Por outro lado, entre os tribunais estaduais com os menores percentuais de composição feminina, destacam-se o Tribunal de Justiça do Roraima (TJRR) com 29,5%, e os Tribunais de Justiça do Piauí (TJPI) e Tocantins (TJTO), ambos com 28,7% e 26,5%, respectivamente.
Com relação à Justiça do Trabalho, as Varas do Trabalho são aquelas que apresentam maiores índices de representação feminina, se destacando o TRT2, com 58,7% de magistradas, acompanhado dos TRT6 (53,8%) e TRT1 (53,1%). Em contraposição, a Justiça Militar Estadual possui o menor índice de representação, a exemplo do Tribunal de Justiça Militar de São Paulo, que apresentou apenas 6,7% de mulheres na sua composição.
Desigualdade no topo da carreira judiciária
Por mais que na 1ª instância do Judiciário já haja considerável discrepância na distribuição entre mulheres e homens, nos tribunais superiores o cenário se mostra ainda mais resistente à participação feminina.
O Relatório apontou que a média da ocupação feminina na magistratura nacional é de 36,8%. Entretanto, se considerarmos apenas os cargos de desembargador e ministro dos tribunais superiores estaduais, federais e especializados, a presença de mulheres chega ao montante 23,9%, conforme pode ser visto no comparativo do Gráfico 02.
Ademais, alguns tribunais de 2° instância apresentam 0% de representação feminina nos cargos de desembargador, como o Tribunal de Justiça do Estado do Amapá (TJAP) e o Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia (TJRO).
Vale ressaltar que no Supremo Tribunal Federal, a mais alta corte do país, somente três mulheres chegaram a ocupar um posto no colegiado em pouco mais de 130 anos de história, sendo a primeira Ellen Gracie, nomeada em 2000 (após 109 anos de existência da Corte), Cármen Lúcia em 2006 e Rosa Weber em 2011.
Caminhos para promover a equidade de gênero
A atuação do CNJ tem sido fundamental na criação de resoluções que buscam promover a equidade no Judiciário. Em 2023, a Resolução n. 525 foi estabelecida para garantir maior participação feminina nas cortes de segundo grau. Outra medida relevante foi a Resolução n. 540, que determinou que 50% das designações de cargos de chefia e assessoramento no Judiciário sejam destinadas a mulheres.
Contudo, ainda há um longo caminho a percorrer. A situação de segregação feminina no Poder Judiciário é ressaltada na fala da presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministra Cármen Lúcia, durante julgamento sobre suposta fraude de cota de gênero nas eleições em 2020: “não é fácil para mulher chegar a qualquer cargo”.
Nestes dias 8 e 10 de março, que estão próximos e se comemoram o Dia Internacional da Mulher e o Dia Internacional das Juízas, é de suma importância ressaltar e refletir sobre a participação feminina na magistratura, pois, além de fortalecer a democracia, também contribui para a construção de uma sociedade mais justa, na qual todas as vozes são ouvidas e consideradas nas tomadas de decisões.